PT dá tiro no pé

Por Kennedy Alencar

A volta de Delúbio Soares ao PT custará caro ao partido e ao governo Dilma. A refiliação do ex-tesoureiro, um dos principais personagens do mensalão, provocará desgaste na opinião pública. Mesmo cientes disso, o PT e o governo parecem dispostos a pagar o preço.

Por quê?

Delúbio ficou calado durante muito tempo. Não atrapalhou a reeleição de Lula em 2006 nem a vitória de Dilma em 2010. Nos bastidores, apresenta sinais de instabilidade emocional. Não suporta mais o ostracismo. Isso preocupa muita gente graúda no PT. Há petistas que falam em chantagem política, ao descrever a veemência do seu pedido de refiliação.

Outro motivo: o ex-tesoureiro deverá ser condenado por formação de quadrilha e corrupção ativa, crimes aos quais responde no processo do mensalão que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal).

O sensato seria aguardar a decisão do Supremo, esperada para o ano que vem. Absolvido, Delúbio poderia pedir a refiliação com forte argumento. Mas ninguém no PT acredita nessa hipótese. Melhor, no cálculo político da sigla, aceitá-lo agora.

Prestes a acontecer, será uma decisão de uma hipocrisia política digna do bordão “nunca antes na história deste país”. É fraca a justificativa de que não há condenação perpétua no Brasil e que, portanto, ele poderia retornar desde que comprometido a ter bom comportamento de agora em diante.

Delúbio não foi para a cadeia. Um partido político decidiu em 2005 que deveria expulsá-lo devido ao papel central no esquema do mensalão. Ora, é um direito de qualquer agremiação escolher quem está apto a integrar seus quadros.

Se refiliá-lo agora, o PT deveria dizer que todo o partido, sem exceções, endossou as ações de Delúbio na tesouraria e que ele foi expulso somente para dar uma resposta política ao eleitorado e não bombardear a reeleição de Lula.

Hoje, a oposição está enfraquecida. O governo parece uma fortaleza. O mais provável é a manutenção desse cenário na próxima disputa presidencial, mas há tempo de sobra para uma reviravolta.

Se tivesse respeito à própria história, o PT diria não a Delúbio. O partido contribuiu para civilizar a política brasileira enquanto empunhou com seriedade a bandeira da ética na política. Mas a legenda não aceita mais ser cobrada pelo padrão ético que ajudou a construir.

Não dá para reescrever a história. É injusto dizer que o mensalão é o maior escândalo de corrupção do Brasil. Inexiste corruptômetro. Mas é justo classificá-lo como o maior escândalo da história do PT e do governo Lula. Delúbio Soares e Marcos Valério são personagens reais de um esquema de compra de apoio político com recursos de origem pública.

No poder central, em nome do pragmatismo, o PT vem dinamitando seu pilar ético para se transformar na maior máquina política do Brasil. Uma pena. Já virou tradição o PT dar tiro no pé quando se sente por cima da carne seca.

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FATO E VERSÃO

A entrada da Vale no consórcio para a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte vinha sendo costurada fazia tempo. Roger Agnelli, de saída da empresa, estava disposto a atender a esse desejo do governo Dilma para preservar a presidência.

Agora, já circula a versão de que ele caiu, entre outros motivos, porque não queria ceder a uma intervenção indevida do governo na maior empresa privada do país.

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AÍ, NÃO

Se dependesse de algumas pessoas do Palácio do Planalto, Rui Falcão não substituiria José Eduardo Dutra na presidência do PT. Mas a maioria do partido não aceitou outro nome.
É uma demonstração de independência em relação ao governo, o que é bom. Na campanha de 2010, Falcão jogou no time que abateu, em pleno voo, uma nova alopragem petista.

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